domingo, 2 de junho de 2013

Simulado de literatura


 

Um dia desta semana, farto de vendavais, naufrágios, boatos, mentiras, polêmicas, farto de ver como se descompõem os homens, acionistas e diretores, importadores e industriais, farto de mim, de todos, de um tumulto sem vida, de um silêncio sem quietação, peguei de uma página de anúncios, e disse comigo:

- Eia, passemos em revistas as procuras e ofertas, caixeiros desempregados, pianos, magnésias, sabonetes, oficiais de barbeiro, casas para alugar, amas-de-leite, cobradores, coqueluche, hipotecas, professores, tosses crônicas…

E o meu espírito, estendendo e juntando as mãos e os braços, como fazem os nadadores, que caem do alto, mergulhou por uma coluna abaixo. Quando voltou à tona trazia entre os dedos esta pérola:

“Uma viúva interessante, distinta, de boa família e independente de meios, deseja encontrar por esposo um homem de meia-idade, sério, instruído, e também com meios de vida, que esteja como ela, cansado de viver só, resposta por carta ao escritório desta folha, com as iniciais M.R. … anunciando, a fim de ser procurada essa carta.”

Gentil viúva, eu não sou o homem que procuras, mas desejava ver-te, ou, quando menos, possuir o teu retrato, porque tu não és qualquer pessoa, tu vales alguma cousa mais que o comum das mulheres. Ai de quem está só! dizem as sagradas letras; mas não foi a religião que te inspirou esse anúncio. Nem motivo teológico, nem metafísico. Positivo também não, porque o positivismo é infenso às segundas núpcias. Que foi então, senão a triste, longa e aborrecida experiência? Não queres amar, estás cansada de viver só.

E a cláusula de ser esposo outro aborrecido, farto de solidão, mostra que tu não queres enganar, nem sacrificar ninguém. Ficaram desde já excluídos os sonhadores, os que amem o ministério e procurem justamente esta ocasião de comprar um bilhete na loteria da vida. Que não pedes um diálogo de amor, é claro, desde que impões a cláusula da meia-idade, zona em que as paixões arrefecem, onde as flores vão perdendo a cor purpúrea e o viço eterno. Não há de ser um náufrago, à espera de uma tábua de salvação, pois que exiges que também, possua. E há de ser instruído, para encher com as cousas do espírito as longas noites do coração, e contar (sem as mãos presas) a tomada de Constantinopla.

Viúva dos meus pecados, quem és tu que sabes tanto? O teu anúncio lembra a carta de certo capitão da guarda de Nero. Rico, interessante, aborrecido, como tu, escreveu um dia ao grave Sêneca, perguntando-lhe como se havia de curar do tédio que sentia, e explicava-se por figura: “Não é a tempestade que me aflige, é o enjôo do mar.” Viúva minha, o que tu queres realmente, não é um marido, é um remédio contra o enjôo. Vês que a travessia ainda é longa, – porque a tua idade está dentre trinta e dous e trinta e oito anos, – o mar é agitado, o navio joga muito; precisas de um preparado para matar esse mal cruel e indefinível. Não te contenta com o remédio de Sêneca, que era justamente a solidão, “a vida retirada, em que a lama acha todo o seu sossego”. Tu já provaste esse preparado; não te fez nada. Tentas outro; mas queres menos um companheiro que uma companhia.

(Machado de Assis, A Semana, 1882)

1. Em qual dos elementos abaixo se baseia a imagem mais recorrente no texto?

a) água           d) fogo

b) terra           e) sol

c) ar

2. No trecho “Ficam desde já excluídos os sonhadores…” (§6º), entende-se que os sonhadores ficam excluídos do grupo dos que:

a) têm condições de serem escolhidos.

b) desejam comprar um bilhete da loteria.

c) sacrificam os outros.

d) querem um diálogo de amor.

e) amam o mistério.

3. No trecho “… precisas de um preparado para matar esse mal cruel e indefinível.” (§7º), o “mal” é:

a) a falta de amor d) a saudade do casamento

b) o tédio da solidão e) a aproximação da velhice

c) o enjôo do mar

4. De acordo com o texto, o cronista teve desejo de ver a viúva porque:

a) ela era distinta e interessante.

b) ela possuía bens que a tornavam independente.

c) ela lhe parecia superior às outras mulheres.

d) ela estava triste e precisava de consolo.

e) ele também estava cansado de viver só.

5. De acordo com o texto, o capitão:

A. pretendia, por motivos pessoais, deixar suas funções de guarda do imperador.
B . não suportava mais a solidão das prolongadas viagens marítimas.
C. tinha a saúde abalada pelo sacudir constante do navio.
D. estava aborrecido porque tinha conflitos com seus companheiros de trabalho.
E. devia procurar a solução para seu problema dentro de si mesmo.

6. Infere-se do texto que, na opinião do cronista:

A. a viúva, tendo sido feliz no primeiro casamento, desejava retomar no segundo o ritmo daqueles dias que se haviam ido.
B. o primeiro marido da viúva fora uma pessoa séria e aborrecida, que poucas alegrias lhe dera enquanto vivo.
C. a viúva pretendia encontrar, no segundo casamento, uma vida mais cheia de aventuras e viagens emocionantes.
D. o verdadeiro objetivo da viúva era constituir uma fortuna razoável, juntando suas posses às do futuro marido.
E. a morte do primeiro marido deixara na vida de sua mulher um vazio que ela desejava preencher com outro casamento.

7. De acordo com o texto:

A. o eventual pretendente à viúva deve procurar resposta a sua carta na redação do jornal.
B. a viúva, ou alguém em seu lugar, procurará na redação a carta do eventual pretendente.
C. o jornal veiculará novo anúncio, em resposta aos eventuais pretendentes da viúva.
D. a viúva deixará na redação do jornal uma carta, em resposta ao pretendente eventualmente escolhido.
E. um novo anúncio fará saber ao eventual pretendente que a viúva oportunamente o procurará.

8. Entre os excertos abaixo, assinale aquele que o autor cria uma metáfora de “vida”:

A. … como se descompõem os homens, acionistas e diretores, importadores e industriais…
B. … o meu espírito, estendendo e juntando as mãos e os braços, como fazem os nadadores, que caem do alto, mergulhou por uma coluna abaixo.
C. … a meia-idade, zona em que as paixões arrefecem, onde as flores vão perdendo a cor purpúrea e o viço eterno.
D. … a travessia ainda é longa, o mar é agitado, o navio joga muito.
E. … o remédio é a solidão, a vida retirada, em que a alma acha todo o seu sossego.

(FUVEST) Texto para as questões 9 e 10:

Os principais problemas da agricultura brasileira referem-se muito mais à diversidade dos impactos causados pelo caráter da modernização, do que à persistência de segmentos que dela teriam ficado imunes. Se hoje existem milhões de estabelecimentos agrícolas marginalizados, isso se deve muito mais à natureza do próprio processo de modernização, do que à sua suposta falta de abrangência. (Folha de São Paulo, 13/9/94, 2-2)

79. Segundo o texto:

A. o processo de modernização deve tornar-se mais abrangente para implementar a agricultura.
B. os problemas da agricultura resultam do impacto causado pela modernização progressiva do setor.
C. os problemas da agricultura resultam da inadequação do processo de modernização do setor.
D. segmentos do setor agrícola recusam-se a adotar processos de modernização.
E. os problemas da agricultura decorrem da não-modernização de estabelecimentos agrícolas marginalizados.

10. No texto “à persistência de segmentos que dela teriam ficado imunes.”, a expressão teriam ficado exprime:

A. o desejo de que esse fato não tenha ocorrido.
B. a certeza de que a imunidade à modernização é própria de estabelecimentos agrícolas marginalizados.
C. a hipótese de que esse fato tenha ocorrido.
D. a certeza de que esse fato não ocorreu.
E. a possibilidade de a imunidade à modernização ser decorrente da persistência de certos segmentos.

GABARITO

  1. A ;
  2. A
  3. B
  4. C
  5. E
  6. E
  7. B
  8. D
  9. C
  10. C

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